quinta-feira, 4 de março de 2010

Campanha da Fraternidade 2010

QUARESMA E CAMPANHA DA FRATERNIDADE
Dom Antõnio Saburido, OSB
Arcebispo de Olinda e do Recife
Tempo de Conversão

A Quaresma propõe recolhimento de quarenta dias, inspirado no exemplo de Jesus Cristo, que encontrou no deserto o ambiente favorável para o diálogo com o Pai, no momento em que recebeu que era chegada a hora de iniciar o anúncio da Boa-nova da salvação. A oração eo jejum, praticados naquele longo retiro, constituíram forças que motivaram o Messias a superar os desafios presentes nas provocações do tentador.
Em nossa realidade, somos convidados a nos revestir das mesmas disposições de Filhos de Deus, na condição de autênticos discípulos, e enfrentar com coragem as tribulações na certeza da vitória. Escutar o silêncio é preciso, para captar o chamado e ter a disposição de dar o sim, confiante como fez o pequeno Samuel orientado por Eli: “Fala, Senhor, que o teu servo escuta!” (1Sm 3,10)
Os sinais de despojamento que a liturgia propõe para a Quaresma nos ajudam a penetrar e avançar na essência do tempo litúrgico. São especialmente importantes as leituras da Sagrada Escritura e do Magistério da Igreja, propostas para a liturgia eucarística e a liturgia das horas durante esse longo retiro espiritual quaresmal. Escutadas, meditadas e rezadas com atenção, essas liturgias se apresentarão como roteiro seguro na caminhada rumo à páscoa.
É atitude de conversão a disponibilidade para o serviço, faz-se necessário sair do comodismo e assumir o desafio da edificação do Reino de Deus. É passo decisivo que, nessa Quaresma, Jesus espera de cada um que tem a humildade de perceber a força do chamado.

Gesto Concreto

As Campanhas da Fraternidade, realizadas mais fortemente no tempo de Quaresma, têm o objetivo de motivar a realização de gestos concretos de solidariedade e caridade. Especialmente quando são apresentados temas sociais de maior importância e urgência, como o deste ano: ECONOMIA E VIDA, com o lema VOCÊS NÃO PODEM SERVIR A DEUS E AO DINHEIRO (Mt 6,24)
É a terceira vez que a CNBB realiza uma Campanha da Fraternidade Ecumênica, sob a coordenação do Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil ( Conic). É bom frisar que não se trata de uma campanha sobre ecumenismo, mas com a participação de outras igrejas.
A primeira Campanha foi no ano jubilar no nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo (2000). O tema foi Dignidade Humana e Paz, com o lema Novo Milênio sem exclusões . Sua proposta era motivar o compromisso com o resgate da dignidade humana ferida nos porões da vida, à luz do sol e nos bastidores da política.
A segunda, em 200, teve o tema Solidariedade e Paz, e o lema foi Felizes os que promovem a Paz. O crescimento da violência, o terrorismo e as guerras ameaçavam as esperanças de um milênio de paz e exigia uma palavra profética da Igreja.

Objetivos Gerais e Específicos

A CF 2010 tem por objetivo geral “Colaborar na promoção de uma economia a serviço da vida, fundamental no ideal da cultura de paz, a partir do esforço conjunto das Igrejas cristãs e de pessoas de boa vontade, para que todos contribuam na construção do bem comum em vista de uma sociedade sem exclusão”. Para sua concretização, o texto-base, elaborado pelo Conic, apresenta cinco objetivos específicos: conscientizar a sociedade da importância de valorizar todas as pessoas; criar laços entre as pessoas; criar laços entre as pessoas de convivências mais próxima, em vista do conhecimento mútuo e da superação tanto do individualismo como das dificuldades pessoais; mostrar a relação entre fé e vida, a partir da prática da justiça, como dimensão constitutiva do anúncio do Evangelho; e reconhecer as responsabilidades individuais diante dos problemas decorrentes da vida econômica, em vista da própria conversão.
O texto-base recomenda que esse objetos e essas estratégias devem ser trabalhados em quatro níveis: social, eclesial, comunitário e pessoal. “Desejamos a preservação da grande casa comum, o planeta Terra, planeta da vida e morada da família humana, e buscamos mudanças na economia, na administração dessa casa comum, em fraterna cooperação entre toda a sociedade: cristãos e cristãs, seguidores de diferentes religiões e pessoas de boa vontade.”

Não se curvar ao Dinheiro

Nos tempos atuais, tudo gira em torno da economia. É o dinheiro que se coloca diante de muitos como o grande valor que determina a realização da pessoa, da comunidade e da sociedade nos âmbitos nacional e internacional. São as grandes potências que se articulam, se levar em conta a situação de fragilidade e dependência, atitude que contradiz os princípos da justiça defendidos pela igreja.
É estarrecedor, por exemplo, constatarmos o crescente comércio de armas de fogo entre as nações. Consequentemente, cresce o número de homicídios, e nesse item, o Brasil está entre os primeiros. As pessoas, nos tempos atuais, matam com grande naturalidade, bastando, para isso, receber a combinada recompensa. Aproveito para manifestar meu apoio ao Estatuto do Desarmamento, que está tramitando no Congresso Nacional, apesar da oposição dos que lucram com o negócio.
O individualismo, nas grandes potências, fecha os olhos diante da imensa população que vive em situação de miséria, chegando muitos a morrerem de fome. É inconcebível que, em pleno século XXI, ainda possamos constatar essa dura realidade.
A preocupação primeira dos jovens, no momento em que vão decidir sua vida profissional, é escolher uma profissão que lhes garanta segurança econômica, colocando em segundo plano a questão vocacional. Fazem isso diante da experiência dolorosa de tantos graduados e até mestres e doutores que conseguiram, com esforço, concluir um curso superior e não encontram vagas no mercado de trabalho.
O lema da CF 2010 nos recorda que “Ninguém pode servir a Deus e ao dinheiro” (Mt 6,24). Também o Evangelho nos ensina: “Onde está o vosso tesouro, aí estará também o vosso coração” (Lc 12,34). É preciso, então, uma vez comprometidos com o Evangelho, tomar uma decisão firme e consciente, além de exercitar-se no desprendimento. É claro que as preocupações citadas no parágrafo anterior são legítimas, sobretudo quando se tem a responsabilidade de um lar, com crianças para serem alimentadas e educadas. É a presença do pecado que gera desigualdades e proporciona injustiças sociais.
A nossa fé nos orienta para a confiança na Providência Divina. Naturalmente, não vamos cruzar os braços e esperar o maná caído dos céus. Devemos, sim, acreditar na força da unidade, colocando os valores nos seus devidos lugares e nos organizando como comunidade de fé que luta e se estrutura na defesa dos seus direitos.
“Eu vim para que todos tenham vida e a tenham em abundância” (Jo 10,10). Essa é a proposta de Jesus , e é esse o ideal a ser alcançado por todos nós, no momento em que nos esforçamos por tornar realidade a presença do Reino no meio de nós. Durante o longo retiro de quarenta dias realizado por Jesus no deserto, Ele nos ensina a não aceitar facilidades, mas e encontrar vida na dureza da cruz.

LENDO E APRENDENDO
CARTAZ DA CF 2010

“Vocês não podem servir a Deus e ao dinheiro” (Mt 2.24). Com essa frase em destaque, o cartaz desta Campanha da Fraternidade representa o desafio de uma escolha cotidiana em nossa vida.

O fundo escuro evoca a penumbra de um templo onde, no recolhimento da oração, as mãos em atitude de súplica diante de uma vela-feita não de cera, mas de dinheiro-revelam o drama do ser humano que precisa de bens materiais para satisfazer suas necessidades, mas que pode também se tornar escravo da ganância. Aquelas mãos suplicantes dirigem uma prece a Deus ou ao dinheiro como se fosse Deus? É a luz de Deus que ilumina ou é o cintilar do ouro que atrai?
O dinheiro é necessário no mundo dominado pelo mercado, onde tudo se compra e se vende. Precisa-se de dinheiro para comprar alimentos, roupas, para cuidar da saúde; para pagar o colégio; para adquirir a moradia; e para custear.
O cintilar do ouro e das moedas, porém, misturam-se fácilmente com a ambição e oe desamor. Você pode se tornar escravo dos bens materiais e depositar neles a sua segurança. Você pode viver acumulando dinheiro e propriedades como se deles dependesse a sua vida. Você não pensa que seus bens podem ser supérfluos e suas necessidades podem ser imaginárias, induzidas pela propaganda, pela moda, pelas promoções de fim de semana. Você também acaba esquecendo que há crianças abandonadas, pobres morando nas ruas, pessoas famintas e doentes e fica cuidando do seu dinheiro como se ele fosse Deus, fechando os olhos para as necessidades do próximo.
Este cartaz convida você a se libertar da dependência dos bens materiais. A pôr a sua confiança em Deus. A fugir da ganância e do egoísmo. A cultivar sentimentos de fraternidades. A contribuir de um mundo mais justo e solidário.